domingo, 26 de dezembro de 2010

Cortesia nas pistas

Cortesia nas pistas

Mário Andretti

Há algum tempo, eu estava dirigindo em uma auto-estrada muito movimentada, repleta de motoristas apressados,  que ”cortavam” outros e faziam gestos irados uns para os outros.  Não pude deixar de pensar em como isso era estranho e como eu preferiria estar dirigindo em Indianapolis a 55 milhas por hora.  Sinto-me mais seguro nas pistas de corrida do que nas estradas.  E tenho uma razão muito boa para isso: Diferentemente de muitos motoristas de hoje, os pilotos de corrida são extremamente corteses uns com os outros. Para quem já assistiu  a alguma corrida de carros isso parece difícil de acreditar, mas é verdade.  Os espectadores não fazem idéia da quantidade de “Por favor” e “Muito obrigado” que é dita numa corrida. Na maioria das vezes isso é dado a entender com gestos.
Esse tipo de cortesia não é exigido.  Não há nada sobre isso nos manuais.
Nós, pilotos, somos corteses uns com os outros por uma razão muito simples:  Isso salva vidas.
Se um piloto vir destroços, óleo derramado ou um acidente na pista, ele avisará os outros que vêm atrás, piscando várias vezes a luz de ré.  À velocidade que dirigimos, isso é a nossa única esperança de evitar uma colisão.
Outro exemplo:  Quando um carro mais veloz vai ultrapassar um outro mais vagaroso, este se coloca em posição permitir a ultrapassagem.  É claro que ninguém gosta de ser ultrapassado, mas os pilotos sabem que uma ultrapassagem  pelo lado errado pode representar problemas para ambos.
Isso não é assim nas vias públicas; geralmente os motoristas respondem com gestos obscenos.. eu tento trazer para a via pública os hábitos das pistas de corrida: quando vejo alguém com a porta aberta, um pneu murcho ou água vazando do radiador, procuro avisá-lo. Quando vejo uma situação perigosa, dou “toquinhos” no pedal para alertar aos que vêm atrás de mim.

Se os motoristas nas rodovias fossem corteses a metade do que são os pilotos, penso que isso salvaria milhares de vidas, infelizmente, a cortesia é muitas vezes confundida com fraqueza.
Pergunte a Emerson Fittipaldi, Rock Mears, Danny Sullivan, Bobby Rahal, dentre os maiores pilotos da atualidade.  Todos dirão que a cortesia é simplesmente uma questão de bom senso.


Lembro-me que no Grand Prix de Nurburgring eu estava tenta ultrapassar Niki Lauda no meio de uma descida: se eu esperasse até o último momento para frear, com sorte poderia ultrapassá-lo, mas ele não me viu e não estou certo do que aconteceu, mas de repente , eu estava iniciando a ultrapassagem. Ele ia me cortar pela frente, mas então me viu e afastou-se, dando-me passagem segura e graças a isso pude me manter no curso. Fui salvo por um gesto de cortesia.
Semanas mais tarde, no Grand Prix da Suécia, eu e Niki encontramo-nos em uma situação similar. Só que desta vez era eu que estava na frente., eu podia tê-lo empurrado para fora da pista, mas não o fiz. Dei-lhe espaço para me ultrapassar.

Uma cortesia chama outra Infelizmente o reverso também é verdadeiro. Quando um motorista é cortado mesmo que perceba que o outro não agiu deliberadamente, irrita-se e essa irritação pode levá-lo a todo tipo de comportamento irracional e perigoso. 
Quando dois pedestres se esbarram acidentalmente em uma calçada, geralmente desmancham-se em sorrisos e pedidos de desculpas,: essas mesmas pessoas agiriam de modo diferente se estivessem ao volante. Parece haver algo nos carros que nos endurece; não pensamos no outro motorista, mas apenas em nós mesmos

Ser cortês é pensar no outro primeiro.
Devemos nos lembrar disso não apenas nas rodovias, mas  em todos os caminhos da vida.

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